Uma Análise Jurídica e Pessoal: Afinal, Ter Uma Conta Offshore é Crime?
Sabe aquela sensação de um frio na espinha que não tem nada a ver com a temperatura? Eu senti isso numa noite de terça-feira. Estava no escritório, já passava das nove, a cidade lá fora era só um zumbido distante. A luz do abajur criava uma ilha de calmaria na minha mesa, iluminando a textura quase aveludada de uma capa de processo. Na TV ligada sem som no canto da sala, uma reportagem sobre alguma operação policial mencionou de passagem “contas em paraísos fiscais”. E a pergunta saltou na minha mente, com letras garrafais e urgentes: conta offshore é crime?
Mesmo eu, um advogado com quase duas décadas de carreira, senti o peso do estigma. Porque essa é a imagem que foi construída, não é mesmo? De algo obscuro, feito nas sombras. Naquele momento, todo o meu planejamento de proteção patrimonial, a minha busca por segurança para a família, pareceu se manchar com essa dúvida. Eu estava fazendo algo errado? A resposta curta, que eu já sabia tecnicamente, é “não”. Mas a resposta completa, a que acalma a alma, essa eu precisei reconstruir para mim mesmo, peça por peça.
Desmontando o Mito: O Ato vs. A Ferramenta
Meu primeiro impulso foi fazer o que faço de melhor: investigar. Deixei o processo de lado, abri o notebook e comecei a tratar a mim mesmo como um cliente. A questão central não era a conta em si. Uma conta bancária, seja ela em Belo Horizonte ou nas Ilhas Cayman, é uma ferramenta. Inerte. Um martelo não é uma arma, mas pode ser usado como uma. A grande virada de chave é entender que o crime nunca está na existência da conta. A pergunta relevante não é se conta offshore é crime, mas sim o que você faz com ela.
O ilícito mora em dois lugares, principalmente: na origem do dinheiro e na sua ocultação. Se o dinheiro enviado tem origem lícita, fruto do seu trabalho, da venda de um bem, de herança… primeiro pilar da legalidade está de pé. O segundo, e mais importante, é a transparência. E aqui entra a Receita Federal do Brasil. A partir do momento em que você declara essa conta, seus saldos, seus rendimentos, ela se torna tão legítima quanto sua poupança no banco da esquina. A ilegalidade, o crime de evasão de divisas, mora na deliberada omissão. É o “não contar” que transforma a ferramenta em arma.
O “Julgamento” no Churrasco de Domingo
A parte mais curiosa de todo esse processo não é a técnica, mas a social. É lidar com as reações. Lembro de um churrasco em família, o cheiro da carne na brasa, o som das risadas. Meu cunhado, gente boa, mas gozador, me deu um tapa nas costas e soltou, alto o suficiente para todo mundo ouvir: “E esse aí, hein? Advogado de sucesso, cheio das contas offshore! Tá escondendo o ouro onde, primo?”.
Naquele instante, eu tinha duas opções: rir e desconversar ou… educar. Escolhi a segunda. Puxei uma cadeira, peguei uma cerveja e, com a maior calma do mundo, expliquei. Falei sobre proteção contra a desvalorização da moeda, sobre planejamento sucessório, sobre a legalidade do processo. Expliquei que a era do sigilo absoluto acabou com os acordos de cooperação internacional. A cara de interrogação dele e dos outros ao redor foi impagável. A pergunta “conta offshore é crime?” pairava no ar, mas agora com uma curiosidade genuína. Foi um mini-tribunal ali, na informalidade, e senti que venci a causa. Foi um alívio maior do que ganhar um recurso no STJ.
A Paz de Espírito da Transparência
Hoje, quando fecho os olhos, não sinto mais aquele frio na espinha. O que eu sinto é a solidez de uma estrutura bem-feita. O custo de assessoria para garantir que cada passo fosse dado dentro da mais estrita legalidade foi, sem dúvida, um investimento alto. Mas foi o preço da minha paz. A paz de saber que não há nada nas sombras.
Minha conta no exterior é parte da minha declaração de imposto de renda, visível e transparente. A resposta para “conta offshore é crime?” está na sua própria conduta. Se for feita com planejamento, com recursos lícitos e, acima de tudo, com total transparência perante o Fisco, ela é uma ferramenta extraordinária de proteção. E dormir sabendo que você não deve nada a ninguém, especialmente ao Leão, é um luxo que dinheiro nenhum compra.